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População se mobiliza e questiona construção de Usina Hidrelétrica no Rio das Garças

Hidrelétrica Boaventura rio das Garças

Os impactos sociais e ambientais da implantação da Usina Hidrelétrica (UHE) Boaventura foram expostos durante audiências públicas nos municípios de Barra do Garças, Pontal do Araguaia e General Carneiro, esta semana. A discussão com a população sobre os prejuízos e benefícios que a UHE pode trazer aos três municípios diretamente afetados é uma das etapas do processo de viabilização do projeto que a empreiteira ECBrasil (Energias Complementares do Brasil) e a Sema (Secretaria Estadual do Meio Ambiente) devem cumprir.

Centenas de pessoas se mobilizaram para questionar o empreendimento. Cartazes com frases de repúdio à hidrelétrica, como “O rio já está na UTI e vocês querem desligar os aparelhos” e “Mais vida, menos barragens”, foram expostos durante as audiências. Em Barra do Garças, a população contrária à hidrelétrica participou ativamente expressando, em vários momentos, seu descontentamento com o projeto em coros de “fora barragem”. Representantes de comunidades de pescadores e indígenas, de organizações ambientais e da comunidade científica local questionaram as formas do empreendimento de minimizar os impactos socioambientais nas audiências, que duraram mais de quatro horas.

O empreendedor da ECBrasil, José Guilherme Antloga do Nascimento, afirmou que a hidrelétrica irá proporcionar a melhoria da qualidade de energia fornecida para os três municípios. Ele explicou que a UHE não vende a energia elétrica aos consumidores e que a conta dos moradores da região não deve diminuir. Ele destaca a demanda nacional por energia: “Essa é uma fonte de energia adicional. Se a população cresce e a economia voltar a crescer, precisaremos de mais energia. Então precisamos sempre estar adicionando fontes”, justifica.

Durante a audiência em Barra do Garças, o estudante Reinaldo Augusto, a partir de um estudo dos professores Inácio Bianchi e Teófilo Miguel de Souza, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), mostrou as vantagens da potencialização de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) no incremento da potência elétrica disponível. Assim, questionou por que não investir na potencialização das usinas já existentes, ao invés de construir novas.

Pessoas da comunidade, como a proprietária rural Helen de Menezes, questionaram por que não investir em outras matrizes energéticas, como a energia solar e a eólica, consideradas menos prejudiciais para o meio ambiente. Segundo José Guilherme, a energia hidráulica supre o que esses tipos alternativos não conseguem, além de terem um alto custo de geração.

Durante as audiências foram apresentados dados do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), que apontam 50 impactos socioambientais negativos e positivos que a usina pode trazer para a região. O responsável pelo Centro Tecnológico de Engenharia (CTE), empresa que fez os estudos, Conrado Spínola, explicou que os impactos negativos podem ser minimizados e os positivos potencializados com programas de compensação que o projeto terá que implantar na região. O estudo mostrou também que sete impactos ambientais são inevitáveis e que não poderão ser minimizados.

Retornos financeiros

Entre os aspectos positivos, foram ressaltados os retornos financeiros que o empreendimento traria para a região. Segundo as estimativas do projeto, Barra do Garças receberá, em 30 anos, como compensação financeira pela utilização de recursos hídricos, aproximadamente 7 milhões de reais, Pontal do Araguaia cerca de 8 milhões e General Carneiro pouco mais de 92 mil, o que equivale a 256 reais por mês, neste último caso. A usina também paga um valor de compensação ambiental correspondente a R$ 1.317.203,55. “Toda pressão que tiver em cima do município vai ter que ser compensada”, afirma José Guilherme.

audiência pública hidrelétrica Boaventura

No Pontal do Araguaia, a audiência ocorreu no câmpus da UFMT

O projeto espera criar, durante a construção da usina, cerca de 250 vagas de empregos diretos e 120 indiretos. Um investimento de 10 milhões de reais em funcionários, valor injetado indiretamente na economia dos municípios, explica o empreendedor. A população presente nas audiências questionou a geração de empregos, alegando que, depois da construção da usina, os trabalhadores que vieram de outras cidades ficariam desempregados, gerando problemas sociais. O representante da ECBrasil afirmou que esse tipo de empreendimento tem oferecido oportunidades de trabalho para a população regional, sendo que de 60 a 70% da mão de obra deve ser local e que será capacitada para determinadas funções. O número de 250 empregos diretos foi comparado por uma das pessoas presentes na audiência ao número de 800 pescadores que compõe a colônia de pescadores da região, que, devido aos prejuízos que a usina causa aos peixes, ficarão com sua renda comprometida.

Prejuízos ambientais

Alguns dos impactos que, segundo Conrado Spínola, não poderão ser amenizados são a alteração da qualidade da água do Rio das Garças, devido à formação do reservatório, a pressão negativa sobre a população de botos e a perda de diversidade de espécies da flora, que ocupam as proximidades da barragem.

O impacto na população de peixes, que terão dificuldade de subir o rio para desova, foi um dos assuntos questionados nas audiências. O coordenador do estudo admitiu que a atividade de migração e a piracema, período de reprodução dos peixes, serão afetadas, mas, segundo ele, se as medidas forem tomadas adequadamente, a atividade pesqueira não deve ser prejudicada. Ele afirma que haverá um “monitoramento continuo” para a manutenção do estoque de peixes e para o acompanhamento de outros impactos ambientais.

A bióloga Lúcia Moreira, que trabalha na Vigilância de Água para o consumo humano, na Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso, lembrou que o Rio das Garças é o manancial que abastece Barra do Garças. Ela questiona se a vinda da barragem não irá causar impacto na quantidade de água para o consumo humano: “Se hoje já temos bairros com problemas de falta de água no período de seca, isso vai aumentar ainda mais”. O representante da ECBrasil, José Guilherme, alega que não haverá prejuízo na quantidade de água, pois será mantido o fluxo necessário para o abastecimento. “Nós queremos mais água, não queremos destruir o rio. É interesse do empreendimento cuidar do Rio das Garças para que a UHE Boaventura prospere”, diz.

O estudante de direito da UFMT, Houston Santos, questionou o estudo de impacto ambiental por não incluir a influência da usina no Rio Araguaia, que tem o Rio das Garças como afluente. O promotor de justiça Marcos Brant também afirmou que uma das preocupações do Ministério Público é a interferência no Araguaia. “O Rio Araguaia é muito mais que os valores ambientais que representa. Existe uma vinculação sentimental e cultural bem própria da região. Existem danos que envolvem essa vinculação sentimental dos povos dessa região. Isso também preocupa o Ministério Público”.

UHE Boaventura General Carneiro

O ciclo de audiências públicas começou em General Carneiro, no dia 3 de agosto

Próximos passos

Após as audiências públicas, a Sema deverá avaliar a viabilidade da construção da hidrelétrica, dizendo se o projeto é viável com ressalvas ou se não é viável, concedendo ou não licença para a construção. Segundo o empreendedor da ECBrasil, José Guilherme, a Secretaria pode pedir documentos complementares, que vão desde um detalhamento até a realização de novos estudos. Há necessidade também que o projeto seja aprovado pela Agência Nacional de Energia Elétrica.

O Ministério Público Estadual encaminhará daqui a duas semanas o processo para perícia, a partir de informações repassadas por técnicos da área. Para seguir, o projeto terá que vencer a resistência de grupos contrários à construção da usina. Ambientalistas já estão se organizando com o restante da sociedade civil para apontar falhas no estudo de impacto apresentado.

Fotos: Magno Silvestri

Vídeo: Robson da Silva Lopes

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