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Prefeitura incentiva cultivo de Crotalária para combater dengue, mas ciência questiona eficácia de m


A Prefeitura de Barra do Garças está distribuindo, à população, sementes de uma espécie de Crotalária, como reforço ao combate do mosquito Aedes aegypti. O método tem sido utilizado em várias cidades, e consiste em usar a planta para ocasionar o aparecimento de libélulas, que seriam predadoras naturais do transmissor da dengue, chikungunya e zika. Porém, a eficácia da leguminosa para essa finalidade não é garantida por especialistas, que temem um desvio às medidas de controle comprovadas cientificamente. A doação de 1500 saquinhos com sementes inicia hoje (18/12), na feira coberta de Barra do Garças.

A Crotalária é muito utilizada na agricultura. Evidências científicas confirmam suas propriedades, por exemplo, na adubação verde, o cultivo para nutrir o solo, e como planta-armadilha, por atrair insetos que atacam plantações agrícolas. Outras finalidades da planta não são comprovadas cientificamente.

Mesmo assim, o uso da planta como arma contra a dengue é realizado há alguns anos por gestores públicos, que insistem no incentivo ao cultivo da Crotalária em residências. Em abril de 2010, foi aprovado pela Câmara Municipal de Dourados, em Mato Grosso do Sul, um projeto de lei que obriga a prefeitura a doar sementes de Crotalária para a população como combate ao Aedes aegypti. Em muitas outras cidades, projetos semelhantes foram e estão sendo discutidos, mas especialistas afirmam não existir estudos suficientes dos efeitos da leguminosa sobre a população de mosquitos.

Segundo o secretário de Indústria, Comércio e Desenvolvimento Rural de Barra do Garças, Fabiano Dallagnol, a planta atrairá libélulas, que se alimentarão de pequenos insetos como mosquitos, diminuindo a população do transmissor da dengue.

Já de acordo com o farmaceutico-bioquímico Thiago Eiti Yamauchi, não existe estudo científico que comprove atratividade causada pela Crotalária às libélulas. Para ele, esse tipo de iniciativa, sem uma verificação de autenticidade científica, pode acarretar em mau uso do dinheiro público. “Outro problema é a falsa sensação de segurança gerada na população e o consequente afrouxamento das medidas verdadeiramente eficazes”, aponta.

Um artigo publicado em 2010, pela revista Vetores e Pragas, classifica o método como “inócuo” e afirma que a divulgação do uso da libélula para o combate do mosquito como verdade científica é uma irresponsabilidade. O artigo ainda indica como forma eficiente de controle das epidemias do Aedes, a eliminação do criadouro do mosquito.

“Não havendo no ambiente urbano pratos de vasos, garrafas com água, plantas aquáticas, caixas d´água descobertas, pneus, ralos entupidos, etc., o risco de epidemia de Dengue é muito baixo ou nulo”, explica a publicação de Carlos Fernando Andrade e Isaías Cabrini, ambos da Unicamp.

Um documento de 2015, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) [Documento IAC 114], em São Paulo, questiona a afirmação de que libélulas se alimentem de Aedes aegypti, com base em observação feita pela professora Janira Martins, decana do Departamento de Entomologia do Museu Nacional. Segundo ela, apenas algumas famílias desse inseto são comprovadamente predadoras do mosquito.

A Secretaria Municipal de Indústria, Comércio e Desenvolvimento Rural, em parceria com o Sindicato Rural e a empresa do ramo agropecuário Agro Amazônia, se baseou em experiências de outros municípios para realizar o projeto de distribuição gratuita de sementes da Crotalária em Barra do Garças. “A ideia é distribuir o maior número possível. Mas temos consciência de que só isso não vai resolver as epidemias relacionadas ao mosquito. Essa é apenas uma das formas para diminuir os casos de zika, chikungunya e dengue”, afirma Fabiano, secretário municipal.

O documento do IAC alerta para a necessidade de razões científicas nas iniciativas do uso da Crotalária nos municípios. O texto ressalta que experiências em outros locais não são suficientes e nem estas tem sido devidamente registradas nas justificativas dos projetos de controle ao Aedes aegypti.

Para Thiago Eiti, não existe fórmula mágica e cada cidade pode utilizar métodos diferentes. “Cada região, cada local demanda uma abordagem específica do problema. Não funciona carro espargindo veneno, não funciona veneno na água ou no ralo. O que funciona é cobrar fiscalização e lutar por saneamento básico e educação.”

foto da capa (Hermann Luyken/Wikimedia CC-Revista Ecológico)

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