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Um novo olhar sobre o lixo: histórias de catadores de latinha da praia Quarto Crescente


Deve-se olhar para um objeto e imaginar potencialidade, como um catador olha para o lixo e percebe todas as possibilidades que aquilo representa. Há muito para ser ensinado sobre sustentabilidade e educação ambiental e é possível aprender em diferentes lugares, com os mais inusitados professores.

É, no mínimo, complexo entrevistar e contar a história de um catador de lixo, principalmente quando a essência deles está escondida embaixo de camadas de timidez e sentimento de intimidação. Por inúmeras vezes fui questionada se eles teriam que pagar alguma coisa para dar entrevista.

Porém, o esforço é válido, basta demonstrar respeito, paciência e reconhecimento. Estar disposto a andar e ouvir, não interromper ou forçar poses e cenas. A simplicidade que mora na espontaneidade é a chave para capturar o carisma da humildade.

Jacileia Araújo da Silva, 38 anos, doméstica.

Há três anos, o sogro de Jacileia Araújo viu no lixo o potencial econômico capaz de suprir as necessidades de sua família. Com o apoio dos parentes ele investiu em uma pequena empresa de reciclagem. Jocileia conta com apenas uma máquina no local que funciona no bairro Nova Esperança, em Aragarças.

Esse ano a família decidiu acampar na praia, em uma pequena barraca onde dormem seis pessoas. A intenção é estar no local de trabalho e poder, além de contribuir com o meio ambiente e a renda, desfrutar do resultado.

O lucro ainda é pequeno, mas faz a diferença no orçamento. Segundo Jacileia, eles pretendem retornar na temporada do ano que vem, catando as latas e acampando na praia.

Luzia de Jesus Santana, 76 anos, aposentada e Simiracy Sales, 55 anos, desempregada.

Dona Luzia é uma senhora extrovertida, de alma jovem e com muita disposição. Há 40 anos começou a trabalhar com latas, criou sua filha e suas raízes as margens do Araguaia.

Ela começou morando na rua um, em Aragarças. Pescava no rio para alimentar a família. Sofreu com o marido que abusava do álcool. Em uma das bebedeiras dele quase foi afogada no rio. Hoje ela recorda isso entre risos, conta que da lata conquistou sua chácara e conseguiu mandar a filha para os Estados Unidos.

Aposentada, dona Luzia voltou a praia para ajudar a comadre Simiracy Sales, para passar a diante o que aprendeu. Para ela, é uma atividade prazerosa. Ao lado da amiga ela se diverte sentindo-se útil e ativa. Simiracy não fica atrás, é vaidosa e animada, está disposta a começar do zero e aprender com a companheira.

Elas, que são sozinhas, ou melhor eram, agora enxergam no ato de catar as latas um antidepressivo.

Flávio Pereira, 30 anos, aposentado.

Flávio é cadeirante e veio da Cidade de Goiás a passeio com seu irmão. Ele não se conteve em complementar a aposentadoria enquanto curte as férias.

Há muitos anos, ele optou por superar suas limitações físicas e ter independência financeira. Ele cata latas em festas, eventos e enquanto passeia pela rua. Então espera ter uma boa quantidade, para compensar, e vende.

Para ele significa superação, como relata muitas pessoas não ajudam ou facilitam o processo de coleta, mas não são elas que vão pará-lo. A atividade rende para ele alegria. Seu corpo é magro e aparentemente frágil, mas quem o vê guiando a cadeira pela areia e o emaranhado de mesas e cadeiras tem certeza que é pura impressão.

Lúcia Ferreira, 52 anos, catadora de latas.

Lúcia é uma mulher nordestina, como milhares de outras, que tem em seu passado a marca da miséria, do desalento. Ao vir para o Vale do Araguaia seis meses atrás, ela deixou as quadrigêmeas de dez anos com a avó e um filho maior de idade.

Aqui ela sobrevive das latinhas e dos trabalhos que consegue em fazendas e chácaras. Ela segue em busca de melhores condições de vida. Fala com alegria dos filhos e da saudade. Muda rapidamente de expressão quando lembra das dificuldades e da fome que a acompanhou do Nordeste até Aragarças.

As latas são atualmente a fonte mais segura de renda, rendem mais que um dia inteiro de serviços em sua terra natal, onde ganhava em média dez reais. Com a incerteza do surgimento de outros trabalhos, a reciclagem é cada dia mais importante em sua vida.

Mulher jovem e bonita, judiada pelo tempo e pelos rumos da vida. Lúcia duvida que é de fato alguém que se destaca, me desafia a provar o que eu relato com minhas palavras. O resultado é a imagem forte e o olhar penetrante que a câmera captura. e arranca dela muitos sorrisos.

Mas a felicidade vem quando agradeço o tempo que dedicou me contando sua história e quando a lembro de quão nobre e importante é o trabalho que ela desenvolve.

Lurdes Aparecida, 49 anos, catadora de latas.

Assim como Luzia, Lurdes é uma mulher marcada pelo tempo. Mais reclusa e de poucas palavras. Sente extrema vergonha de se relacionar com a câmera e com as perguntas. Veio de Moiporá, Goiás e assim como sua cidade ela é uma pessoa pacata.

João da Silva, 65 anos, aposentado

João trabalha desde muito cedo. Por anos foi lavrador. Aposentou-se, mas a renda não é suficiente. João mora sozinho e para ajudar nas despesas ele cata latinhas. É mais novo que o meu avô, mas exibe um cansaço que lhe atribui uma idade mais avançada, mas não se deixe enganar, é mais rápido e ágil do que uma jovem de 18 anos em plena flor da idade como eu.

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