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Questões ambientais e culturais ganham destaque em evento da UFMT Araguaia

Durante dois dias, temas como sustentabilidade, biodiversidade, reciclagem e uso de plantas medicinais foram discutidos na quarta edição do ICHS Interativo, promovido pelo Instituto de Ciências Humanas e Sociais e pelo Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde da UFMT Araguaia. O evento, que terminou ontem, debateu a relação entre os saberes populares e científicos.

O objetivo do evento foi chamar a atenção para a importância de valorizar o conhecimento popular e sua politização para promover uma luta contra as desigualdades sociais. Segundo um dos organizadores, Victor Santos, esses saberes estão sendo silenciados e esquecidos e precisam ser valorizados: “São eles a mãe de todo conhecimento que permeiam do campo cientifico. São através deles que a ciência avança”.

Foram realizadas diversas atividades como oficinas, palestras e minicursos, muitas delas voltados às questões ambientais, que têm estado presentes no ICHS Interativo desde sua primeira edição, em 2016.

O Cerrado sustentável

O professor e antropólogo Alexandre Lemos falou sobre desenvolvimento sustentável no Cerrado pela perspectiva dos indígenas Xavante.

Uma prática muito importante para a valorização do Cerrado realizada pelos Xavante é a produção através do buriti. Embora não esteja em escassez, pois a tribo respeita o modo sustentável da natureza, a árvore demora cerca de 8 a 10 anos para crescer.

As mulheres da tribo dominam essa modalidade, indo para a mata em grupos de 5 a 10, recolhendo a fibra do buriti e fazendo cerca de 4 tipos de cestas para vender, assim movimentando sua economia. Elas também fazem esteiras que servem para o próprio descanso. “Esse artesanato gera um certo lucro para toda a aldeia, através das sementes do bioma do cerrado. A aldeia Xavante Pimentel Barbosa é a única que faz esse trabalho com o buriti, diferenciando-se das outras”, diz o antropólogo.

Os Xavante utilizam também a semente de jatobá que é retirada da árvore, respeitando seu plantio. O jatobá ajuda a manter a qualidade da água. Também é usado o breu ou amescla, que são raspados da árvore e ajudam a curar problemas respiratórios além do uso cultural por todos da aldeia.

Os Xavantes praticam etnoecologia, ou seja, realizam ecologia usando do bioma predominante, o cerrado. Os indígenas respeitam a terra e seu ciclo finito, afirma Alexandre.

Minicurso Desenvolvimento sustentável no Cerrado pela perspectiva da tribo Xavante. Fotos: Júlia Viana

Plantas medicinais

"Chás-Xarope: passado e presente", foi o tema de uma oficina ministrada pela professora Nair Bizão, do curso de farmácia da UFMT. A oficina teve como objetivo associar o uso de plantas medicinais (chás e xarope) utilizando o conhecimento popular e científico.

A professora iniciou a oficina mostrando as diversas plantas que são utilizadas para fazer chás e xaropes que podem melhorar a nossa saúde, dentre elas erva santa maria, chambá, bálsamo, hortelã, losna e capim cidreira.

Mesmo sendo uma prática antiga, o uso de plantas medicinais permanece sendo muito utilizado nos dias atuais, e cada planta apresenta substâncias para se protegerem: leite, cheiro, tanino.

Logo no início da oficina cada participante fez o seu próprio chá sob orientação da professora. Nair ressalta que quando ingerido de maneira correta, tanto o chá quanto o xarope terão o mesmo resultado que o medicamento industrializado. E acrescenta que o chá é de grande importância porque a pessoa estará ingerindo também um pouco de açúcar, vitamina, etc.

A professora também deu instruções para fazer xarope, como o de Guaco com abacaxi, muito ultizado para tratamento das vias respiratórias, reumatismo e tosse. Ela ensinou que plantas secas no sol não são recomendadas para fazer chá ou xarope e apresentou uma síntese das plantas e suas utilidades medicinais: •Guaco: vias respiratórias, reumatismo; •Hortelã: digestivo, tônico; •Bálsamo: gastrointestinal, pele inflamada; •Carqueja: anemia, diabetes, fígado; •Chambá: respiratório, coração; •Levante: vermes, calmante.

Minicurso Chás-xarope: passado e presente. Fotos: Marina Cintra

"Reciclagem criativa"

A mestranda em Antropologia da UFG, Marta Quintiliano, ensinou a técnica de criação de bonequinhas Aboyami, feitas com retalhos, e o seu significado histórico.

Na oficina, Marta comentou que há duas versões para a história das bonecas, a primeira é a romantizada, contada pelos colonizadores, sobre mulheres africanas que rasgavam suas saias e faziam essas bonequinhas para acalmar seus filhos. Já a segunda diz que as bonecas foram crescendo junto com o movimento negro de 1980, quando muitas pessoas estavam buscando a sua identidade afrodescendente. Foi dentro desse contexto que a Abayomi teria surgido, inicialmente, com um grupo de quatro pessoas.

Para a palestrante, as bonecas são de "reciclagem criativa" pois são feitas de retalhos reciclados, para não haver desperdício, estimulando assim a criatividade e paciência. Sua estrutura é feita basicamente por duas fitas pretas de qualquer pedaço de tecido (para compor o corpo), com apenas nós para fazer cabeça, mãos e pés, e os retalhos vão servir como vestidos, saias e blusas.

O objetivo do minicurso foi resgatar a cultura negra, sua tradição e poder, representados pelas bonecas abayomi, e apresentá-la àqueles que não a conhecem.

Oficina de bonecas Aboyami. Fotos: Ester Moraes

Biopirataria

A apropriação da nossa biodiversidade foi o tema do minicurso ministrado pelo professor de direito ambiental da UFMT-CUA João Paulo Rocha de Miranda.

O minicurso abordou a apropriação indevida de recursos biológicos dos países em desenvolvimento e ricos em biodiversidade pelos países que dominam os processos biotecnológicos mais modernos e sediam grandes corporações industriais de engenharia genética.

O professor, que lançou no evento seu livro com a mesma temática, enfatizou sobre as produções de remédios com ingredientes naturais e originários da Amazônia. Além disso, ressaltou a importância de frutas como o açaí, muito valorizado nos dias de hoje, a andiroba, copaíba, cupuaçu, entre outros. Ele lembra que o Brasil é o país com maior biodiversidade do mundo, e que não devemos patentear a vida, nem mesmo parte dela.

Para João Miranda, a apropriação de plantas e animais brasileiros por empresas e cientistas estrangeiros é uma questão preocupante: “Esse processo vem sendo chamado de biopirataria, ou biocolonialismo, ou colonialismo biocultural e a gente demonstrou aqui o que era isso o quais os instrumentos que existem para combater essa prática, essa apropriação por outros países da nossa biodiversidade.”

Ele salienta que o tema ainda é novo e pouco conhecido na sociedade, mesmo na área jurídica. “É muito importante aqui na universidade de forma multidisciplinar que isso seja discutido. Porque, afinal de contas, estão sendo formados novos profissionais que vão levar essa ideia para o mercado de trabalho, para suas vidas e para a sociedade.”, avalia.

Minicurso Colonialismo biocultural e a apropriação da nossa biodiversidade. Fotos: Bruno César

O ICHS Interativo é realizado semestralmente. Os temas tratam de questões sociais, culturais e políticas. A divulgação das temáticas escolhidas a cada edição é realizada na página do Instituto de Ciências Humanas e Sociais da UFMT Araguaia no Facebook.

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