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Reunião em Pontal do Araguaia sobre instalação de hidrelétrica registra poucos presentes e ausência


A Câmara Municipal de Pontal do Araguaia promoveu na quinta-feira, 24, uma reunião técnica sobre o projeto de instalação da Usina Hidrelétrica (UHE) Boaventura, no rio das Garças. O objetivo era dialogar com representantes da sociedade e trazer informações sobre o empreendimento, mas poucas pessoas compareceram. O auditório da Câmara reuniu cerca de 25 pessoas, entre vereadores, membros da Frente Popular Rios Vivos, representantes da produção agrícola, pesquisadores e universitários. Representantes da empreendedora Energias Complementares do Brasil (ECBrasil), responsável pela obra, também não estavam presentes.

A reunião visava reunir informações técnicas e opiniões da comunidade sobre o projeto UHE, para a elaboração de manifestação formal da casa a respeito do projeto da UHE, solicitada pelo Ministério Público Federal (MP), através da Procuradoria da República de Mato Grosso. A Câmara ainda não se posicionou e manifestou o desejo de realizar maior discussão sobre o assunto. A partir da atuação de militantes e grupos organizados em defesa dos recursos naturais da região, o MP pede aos poderes municipais das cidades afetadas pelo empreendimento que incentivem o debate sobre os impactos ambientais da unidade hidrelétrica.

O advogado da Câmara, Paulo Henrique Gomes Marques, justificou a ausência de mais membros da sociedade dizendo que essa não era uma audiência pública, em que seria convidada toda a população, mas uma reunião técnica, para discutir o assunto com representantes de setores da sociedade. Ele afirmou não haver tempo hábil para convocar uma audiência pública, devido ao prazo dado pelo MP. Segundo Paulo Marques, que esteve com o Ministério Público Federal, o órgão quer saber qual a posição da comunidade pontalense sobre a instalação da hidrelétrica que afeta diretamente o município.

Além da falta de maior representação dos cidadãos do Pontal do Araguaia, alguns presentes questionaram a ausência de representantes da empreendedora ECBrasil. A empresa não foi solicitada a comparecer por já ter participado de audiência pública no município, em agosto. O próprio presidente da Câmara, José Marques Figueiredo de Souza, além de lamentar a falta de mais representantes da comunidade, reconheceu a necessidade da presença da empresa e da terceirizada responsável pela elaboração do estudo de impacto ambiental, Centro Tecnológico de Engenharia (CTE). “Para ser uma reunião técnica, acho que no mínimo deveriam estar presentes técnicos responsáveis pelo relatório ambiental”, disse o presidente.

José Marques manifestou interesse em conversar com os técnicos responsáveis pelo estudo ambiental do empreendimento para colher mais informações sobre o projeto. O parlamentar afirmou que pretende marcar nova audiência com a presença da empresa, de técnicos, de especialistas e da comunidade em geral. “Nós temos que fazer uma análise completa antes de colocar nosso posicionamento. Esse projeto gera emprego, gera renda? E a natureza?”, questiona.

Boa parte dos presentes na reunião eram membros da Frente Popular Rios Vivos (imagem: Kayc Alves)

Questionamentos

O estudante de direito e técnico em controle ambiental, Houston dos Santos Sousa, questionou a ausência de estudo detalhado de impacto sobre o rio Araguaia no relatório apresentado pela empreendedora. “Talvez eles não quisessem fazer estudo sobre o rio Araguaia, porque iria demandar mais burocracia. O estudo de impacto ambiental não seria avaliado apenas pela Sema, mas pelo Ibama também.” Como o Araguaia é um rio interestadual, em caso de empreendimentos que o afete, é o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) que se responsabiliza pelos estudos ambientais. O estudante também citou a experiência do rio Caiapó, goiano, que sofreu impactos negativos irreversíveis após instalação de unidades hidrelétricas.

Houston Sousa, ainda sugeriu que o Pontal do Araguaia também se mobilize para elaborar um abaixo assinado e submeter ao legislativo um projeto de lei de iniciativa popular, que torne o rio das Garças patrimônio do município. Ele é membro da Frente Popular Rios Vivos, grupo que está colhendo assinaturas em Barra do Garças para aprovar projeto semelhante. O presidente José Marques afirmou que se respeitada a legalidade que tal iniciativa exige, a casa não é contra.

O biólogo e estudante de pós-graduação em ecologia e conservação, Carmino Emidio Junior, chamou a atenção para o fato de o estudo de impacto ambiental não apresentar uma relação de espécies endêmicas, grupo animal ou vegetal habitante de uma região com características específicas que garantem a sobrevivência da espécie. Baseado na experiência de ter acompanhado a instalação de três unidades hidrelétricas na bacia do rio Teles Pires, ele afirmou não ser possível que o estudo não tenha identificado nenhuma espécie endêmica. “Se a espécie é endêmica, ela necessita de um habitat específico. Quando você faz o remanejamento de fauna, que é retirar o animal de um local e o coloca em outro similar, a espécie corre mais 70% de risco de morrer.”

Carmino Junior ainda apontou várias outras falhas no relatório de impacto ambiental apresentado pela empresa, sobretudo, a falta de detalhamento das medidas de compensação dos efeitos negativos da instalação da hidrelétrica, que apenas indicam o que será feito, mas não como essas ações serão executadas.

O professor de Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Magno Silvestri, lembrou que a Sema realizou as audiências públicas em agosto sem que o Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) contivesse os pareceres da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Segundo o próprio EIA/RIMA (que pode ser acessado aqui), tais órgãos seriam responsáveis por estudos próprios sobre os impactos na população indígena e na herança arqueológica da região. O professor também apontou que os estudos da empreendedora não consideram o povo Bororo como afetados pelos impactos do projeto. “O EIA/RIMA não leva em consideração o modo de vida, a visão de mundo, a espiritualidade dos povos originários, que estiveram na audiência pública, em Barra do Garças e afirmaram que serão sim afetados pelo empreendimento.”

foto da capa (Kayc Alves): reunião na Câmara Municipal de Pontal do Araguaia

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